19 de fevereiro de 2010

Realpolitik

Não sou muito dado a falar sobre política sem um copo de cerveja por perto, mas como tem eleição em 2010, resolvi fazer uma generosa exceção.

Nesta estreia, vou falar de um assunto que está pegando geral: a polêmica da polarização na campanha à presidência. Muito se fala dessa tal eleição pebliscitária – ou seja, um embate direto entre o PSDB e o PT, personificados nos pré-candidatos José Serra e Dilma Roussef, respectivamente. A causa disso é uma só: Lula quer que o eleitorado compare o governo FHC com o seu, que é indiscutivelmente superior, e, por tabela, dar um boost na candidatura petista.

Lógico que a oposição não está a fim de cair nessa armadilha à la Dick Vigarista e partiu pra pressão. Em artigo recente, FHC saiu para salvar sua pele, afirmando que a polarização seria um jogo sujo do governo. Parte da imprensa também está sentando o pau. O Josias de Souza, por exemplo, pirou e mandou uma das metáforas mais insanas do ano: "É como se tivéssemos um jantar com trinta pratos [referindo-se ao número aproximado de partidos políticos registrados no país] e o presidente dissesse que nós só poderíamos nos servir com dois deles."

Toda essa discussão até faz sentido, se a polarização não fosse uma jogada manjadíssima. Tanto que deveria constar no primeiro capítulo de qualquer manual de politicagem para principiantes. Só para se ter uma ideia, nas últimas quatro disputas presidenciais, as chapas do PSDB e do PT sempre foram os concorrentes diretos. Em outras palavras, a única vez em que não houve uma eleição plebiscitária foi em 1989, quando uns trocentos candidatos concorreram – até Silvio Santos entrou na parada.

Por que então essa questão foi levantada justo agora? Simples. Porque pela primeira vez a eleição plebiscitária não interessa à coligação PSDB/DEM. Em 1994, isso ainda era novidade. Em 1998, o FHC tava numa boa e descolou a reeleição no primeiro turno. Em 2002, a direita botou medo nos investidores sobre o risco do PT no poder. E em 2006 a oposição achou erroneamente que o escândalo do mensalão ia tornar a disputa um mamão com açúcar – tanto que arriscaram o nome de Geraldo Alckmin como candidato.

Pois eis que, em 2010, a tática vira contra os tucanos. Com Lula mandando ver e a oposição sem discurso, lógico que eles querem trocar de estratégia. Segundo os jornais, a ideia da direita é focar na biografia dos candidatos, com clara vantagem para José Serra, que é um velho lobo da política nacional. Mas o bicho vai pegar quando compararem com a história da Marina Silva, que, na minha humilde opinião, tem muito mais apelo aos olhos do público, embora tenha pouco poder de fogo político.

O fato é que todo esse celeuma desnecessário mascara um grave problema no Brasil, que é a falta de qualquer noção de política por parte dos eleitores. Os partidos sabem que o povo não escolhe pelo que o candidato é, mas pelo que aparenta ser. Por isso, eles precisam ser rasos como um pires para fazerem sentido. Por exemplo, se um cara fala que vai lutar por uma reforma tributária, importatíssima para o desenvolvimento do Brasil, e outro dizer que vai lutar por mais empregos, sem explicar como, é óbvio que a galera vai escolher o segundo – mesmo que o malandro seja um grande salafrário – pois ele tem um discurso mais forte do que o primeiro.

E é nisso que os dois principais presidenciáveis se apóiam: em obras e realizações do passado. Na real, tudo isso pouco importa. O que importa é o que cada candidato pretende fazer no futuro, segundo a realidade do nosso país. Mas, no atual jogo político brasileiro, a quantidade de obras inauguradas vale muito mais do que um programa de governo.

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