24 de março de 2011

Top 5 covers dos Beatles

Escolher o top 5 covers já feitos dos Beatles é uma missão tão hercúlea e arriscada quanto tentar escolher o melhor álbum deles. São tantas opções que o serviço se torna digno apenas aos mais corajosos que já pisaram sobre a Terra, o que não é o meu caso. De qualquer forma, a minha lista é essa:


5) Johnny Cash - "In My Life"


Quando escreveu "In My Life", John Lennon tinha apenas 25 anos e enfrentava problemas no seu casamento com Cynthia. Nesse momento turbulento, ele resolveu fazer uma música que falasse sobre as coisas boas da juventude. Johnny Cash certamente gostava dos seus tempos de mocidade, mas quando regravou "In My Life" já com 70 anos e com a saudade debilitada, aparentemente estava mais saudoso da vida em si, repassando mentalmente tudo o que já tinha vivido. Pelo menos é o que faz crer.

4) Oasis - "I Am The Walrus"


O Oasis tem a curiosa mania de se comparar aos Beatles. Na verdade, suspeito que isso tem mais a ver com alguma obsessão doentia dos caras, próximo ao tipo de fanatismo que fez a cabeça de Mark David Chapman – só que ao invés de usar uma arma, eles fazem música, graças a Deus. De qualquer maneira, outra mania curiosa do Oasis é a de terminar os shows tocando "I am The Walrus". Isso se tornou tão lugar-comum que eles acabaram gravando a música para o álbum "The Masterplan" (1998).

3) James Brown - "Something"


Reza a lenda que "Something" é a segunda música mais regravada dos Beatles, ficando atrás de "Yesterday". Portanto, deve haver uma porrada de bons covers por aí, mas poucos devem ser tão interessantes quanto este feito por James Brown, o Godfather do soul. Tanto que até George Harrison tirou o chapéu e disse que esta é sua versão favorita.

2) Sonic Youth - "Within You Without You"


Outro clássico de George Harrison, interpretado dessa vez pelo pessoal do Sonic Youth. Não há muito o que comentar aqui.

1) Herbie Hancock - "Tomorrow Never Knows" (Feat. Dave Matthews)


"Tomorrow Never Knows" não é nem de longe a melhor faixa de Revolver, mas certamente é uma das mais intrigantes, com todos aqueles efeitos sonoros estranhos e com os versos inspirados no livro "A Experiência Psicodélica", de Timothy Leary, o guru do LSD, que por sua vez foi baseado no "Livro Tibetano dos Mortos", a Bíblia do Budismo. Herbie Hancock, que também curte umas experimentações musicais estranhas e é budista, fez uma versão mezzo lounge mezzo psicodélica, com resultados interessantes.

13 de março de 2011

Big Star: A melhor banda que ninguém nunca ouviu

A curta porém intensa história do rock é repleta de passagens curiosas. Nesse quesito, o Big Star merece uma menção que seja. A história dos caras é a seguinte: no início dos anos 70, quando o sonho dos Beatles já tinha acabado, os Rollings Stones já estavam atrás de sons novos, o Syd Barret já tinha sido enxotado do Pink Floyd por suas doideiras, o Brian Wilson já tinha entrado numa viagem de LSD e não retornado, e o hard rock começava a fazer a cabeça das pessoas, com bandas como Led Zeppelin, Jimi Hendrix Experience, Black Sabath e Deep Purple, surgia na contramão da história o Big Star, com seu rock leve e descompromissado inspirado no som da Invasão Britânica dos anos 60.

Mas a coisa vai muito além de estar no lugar errado e na hora errada. Mesmo com o talento assombroso dos caras e da mistura perfeita de ritmos, o Big Star jamais alcançou a fama devido a uma urucubaca pesada que perseguiu o grupo durante seu pouco tempo de existência. A coisa só melhorou anos depois, quando um pessoal talentoso redescobriu a banda e promoveram um revival, mas, apesar disso, a verdade é que até hoje eles são mais reconhecidos pela crítica do que pelo grande público. Essa talvez seja uma das sinas mais folclóricas do rock.

O Big Star nasceu em 1971, em Memphis, Tennessee (EUA), composta pelo vocalista e guitarrista Alex Chilton, pelo também guitarrista Chris Bell, pelo baterista Jody Stephens e pelo baixista Andy Hummel. Chilton e Bell eram colegas de colegial que compartilhavam a paixão pelos Beatles. Chegaram a montar uma banda nessa época, mas a coisa não foi pra frente. Eles, então, tomaram rumos diferentes: Chilton foi tocar numa banda de R&B chamada DeVilles, que depois passou a se chamar The Box Tops. Eles emplacaram alguns hits no final dos anos 60, mas nada de tão memorável. Em 1969, Chilton resolveu sair de sua cidade e ir para Nova York tentar a vida como cantor folk, com um violão debaixo do braço à la Bob Dylan. A aventura não deu muito certo e ele voltou para Memphis em 1971.

Nesse meio-tempo, Bell começou a trabalhar no recém-criado estúdio Ardent, que mais tarde receberia Led Zeppelin, Isaac Hayes e REM, entre outros nomes desse quilate. Ele também costumava tocar em bares e pequenas casas de show com sua banda, Icewater, junto com Hummel e Stephens. Tal qual na turnê dos Beatles em Hamburgo em 1962, o repertório consistia basicamente de covers de outras bandas que faziam sucesso na época, com uma ou outra canção de autoria própria. Recém-chegado à cidade, Chilton gostou do que ouviu e apresentou algumas músicas que compôs. Lógico que ele foi convidado para entrar para a banda.

Com a nova formação, eles praticamente se trancaram no estúdio para gravar o primeiro álbum. As sessões eram longas e extenuantes. Numa dessas, eles resolveram dar uma pausa e filar um petisco no supermercado da esquina, o Big Star Foodmarkets. Nisso, algum insano resolveu batizar a banda de Big Star e o nome pegou.

O primeiro disco deles, #1 Record, foi lançado em abril de 1972. O interesse pela música negra de Chilton misturou-se com a influência dos Beatles de Bell e, com as contribuições de Hummel e Stephens, criaram um álbum interessantíssimo. As composições são extremamente criativas, com riffs que grudam na cabeça e mudanças melódicas perfeitas. A faixa de abertura "Feel", por exemplo, começa com uma porrada pura até cair numa espécie de melancolia no refrão, seguido de um bridge com metais ao estilo soul. Apesar de todos terem contribuído nas composições, eles quiseram mimetizar os Beatles e creditaram quase todas as faixas como Bell/Chilton. Anos depois, duas músicas deste álbum ficariam conhecidas por causa do That’s 70 Show: “In The Street” e “Thirteen”.

Apesar de ter sido bem recebido pela crítica, problemas gerenciais na gravadora Stax fizeram com que os discos simplesmente não chegassem às lojas. As vendas baixas caíram como uma bomba no grupo. Já rolavam discussões sobre se eles fariam turnês – como queria Chilton – ou se seriam uma banda de estúdio – tal como planejava o beatlemaníaco Bell. As rixas foram aumentando até chegarem às vias de fato, com a porradaria comendo solta entre Bell e Hummel. Chris Bell, então, deixou o grupo perto do Natal de 1972.

Mesmo assim, os planos para um novo disco continuavam de pé. Radio City foi lançado em fevereiro de 1974, mas sem o mesmo frescor do álbum de estreia. Apesar de algumas boas canções, como “Back of Car”, “I’m in Love with a Girl” e “September Gurls” (cujo termo foi depois adotado pela Katy Perry em “California Gurls”), no geral Radio City é apenas mediano. Os críticos viram com entusiasmo o disco, já que ele manteve intacto o belo som da banda mesmo com toda a confusão que rolou. Mas mesmo quem quisesse conferir não conseguiria, pois novamente problemas de distribuição da gravadora, dessa vez na Columbia, fez com que poucos álbuns chegassem às lojas.

Com isso, Andy Hummel pediu as contas e foi embora. Mesmo assim, Chilton e Stephens entraram em estúdio naquele mesmo ano para gravar o terceiro álbum do Big Star. Mas era óbvio que todos os acontecimentos que envolveram a banda até o momento trariam mudanças profundas. Algumas canções são tão melancólicas que fizeram o álbum ser escolhido como o mais triste da história pelo jornal New Music Express, batendo qualquer outra coisa já feita pelo Joy Division. Perto de “Holocaust” e “Big Black Car”, The Smiths é tão alegre quanto um axé. Eles também romperam com muitas outras características dos discos anteriores. Em vez de falar sobre garotas, as letras mostram-se muito mais maduras, sobra até uma música meio cristão natalina chamada “Jesus Christ”. E o arranjo de cordas foi usado de maneira soberba, como em “For You” e “Take Care”, deixando as coisa ainda mais dramáticas.

Na verdade, Chilton e Stephens não planejavam lançar o álbum sob o nome do Big Star. Aquilo estava mais para um projeto paralelo do que um caminho natural da banda. Um dos nomes cogitados para o duo seria Sister Lovers, porque na ocasião eles estavam namorando duas garotas que eram irmãs. De qualquer maneira, aquele apanhado de músicas tristes e mal acabadas se mostrou um tremendo disco. O problema é que a Stax, a gravadora que lançaria o álbum, foi à bancarrota em 1975, antes de seu lançamento. Para piorar, muitos consideravam o disco comercialmente inviável. Então, as músicas só circulavam por meio de cópias demos de mão em mão, até que a gravadora PVC decidiu lançá-la em 1978. Só que nessa época o Big Star já tinha acabado e, tal qual os Beatles, eles estavam mais preocupados com suas respectivas carreiras solos do que qualquer outra coisa. E nesse mesmo ano, Chris Bell, que se tratava de uma crise de depressão, morreu em um acidente de carro em Memphis.

Mesmo com o karma negativo que atravessou toda a trajetória do Big Star, eles acabaram sendo redescobertos por uma parcela de artistas que começava a aparecer nos anos 80, como REM, Teenage Fanclub e Cheap Trick. Foi mais ou menos nessa época que o termo Power Pop apareceu, com o Big Star cravando seu lugar no panteão do estilo. Segundo o AllMusic, “Power Pop é o cruzamento do barulho do hard rock do The Who e da melodia suave dos Beatles e Beach Boys, com uma pitada de guitarras dos Byrds”.

Seus discos foram relançados, e dessa vez o pessoal poderia finalmente ouvir seus álbuns. Mas mesmo assim, o Big Star continuou relegado mais aos fanáticos por música do que para o público. Os críticos mais exaltados chamavam-os de "A melhor banda que ninguém nunca ouviu falar" e "Os Beatles norte-americanos". Na década de 90, o power pop ficou badalado entre as bandas indies, como Wilco, Elliot Smith e Pavement, e o que já era alternativo por natureza acabou virando alternativo por filosofia.

Todo esse revival fez com que o Big Star voltasse aos palcos em 1993, com Chilton e Stephens tocando com Jon Hauer (ex-Posies) e Ken Stringfellow (que tocou com uma porrada de gente). Em 2005, a banda lançou o disco inédito “In Space”. Mas era evidente que as coisas já não eram como antes. Seria como se Paul McCartney e Ringo Starr juntassem uma galera e usassem o nome The Beatles para lançar um disco inédito. Tem coisas que é melhor deixar quieto.

Alex Chilton morreu em março de 2010 devido a problemas cardíacos. No próximo dia 26 vai rolar um show em tributo a ele em Nova York, com a presença do pessoal do REM, Yo La Tengo! e Primal Scream, entre outros fãs de renome. Também em 2010, em julho, morreu Andy Hummel, vítima de câncer.

5 de março de 2011

Zeitgeist SP

Todo mundo sabe que o Kassab faz parte do lobby das imobiliárias, assim como boa parte da bancada governista da Câmara Municipal. Ele e diversos vereadores quase foram cassados no ano passado por terem recebido doações ilegais da Associação Imobiliária Brasileira durante as eleições de 2008. Conhecendo a Justiça brasileira, seria muito improvável isso se consumar, mas pelo menos a mídia acabou divulgando a nefasta revelação. E apenas a título de curiosidade, Kassab trabalhava como corretor de imóveis antes de entrar na política.

Isso explica bastante coisa. Em 2009, houve a polêmica revisão do Plano Diretor da cidade de São Paulo. O trecho mais indecente era a que alterava a utilização das ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social), que são destinadas para a construção de moradias populares. A mudança permitiria que as zonas fossem usadas livremente pelo mercado. Em julho de 2010, um juiz invalidou o novo Plano Diretor por não ter contado com a participação popular devido a falhas na audiência pública. Aparentemente, o projeto ainda está na Câmara Municipal para ser votada.

Há também o projeto Nova Luz, que pretende dar carta branca para um consórcio desapropriar e demolir os imóveis que quiserem. A ideia de revitalizar a região é até nobre, mas a falta de transparência está botando o terror em quem vive por ali. Segundo uma associação de moradores local, a prefeitura não deu nenhuma garantia de que o pessoal que será desapropriado voltará ao antigo endereço. E nem eles nem os comerciantes sabem o que farão da vida enquanto as obras estiverem rolando. Nenhum espaço provisório foi indicado pelo governo municipal. Também não há qualquer menção sobre o que será feito dos nóias que vão fumar crack por lá. Possivelmente vão ser chutados para algum outro canto da cidade, como sempre.

Aliás, ainda em 2009, a prefeitura fechou diversos albergues no centro da cidade e abriu novas vagas nos bairros da periferia. Também cancelou programas como o Oficina Boracéia, que atendia a população de rua. É muito óbvio sacar o significado disso: quanto mais longe esse pessoal ficar do centro, mais a região se valoriza. Sem muita alternativa, muitos sem-tetos passaram a dormir embaixo do Minhocão, mas eles acabaram sendo expulsos pelos comerciantes dos arredores. Hoje é possível ver alguns deles se abrigando na região de Higienópolis ou perto do metrô Santa Cecília.

Não por acaso, a mais recente vítima da especulação imobiliária é a baixa Augusta, que está localizada numa região privilegiada do centro – entre a Paulista, a Consolação e a República. Redescoberta pela juventude alternativa paulistana, agora ela está prestes a virar uma Vila Olímpia gay, segundo a opinião de um amigo que mora lá perto. As casas de tolerância estão dando lugar a novas casas de show e construções. Há 11 edifícios sendo erguidos, com preço médio de R$ 6 mil o metro quadrado, valor comparável com o metro quadrado da Faria Lima, onde não é possível construir mais nada e os imóveis são disputados à tapa.

Além de elitizar, a especulação imobiliária também é a responsável pelos índices recordes de trânsito na capital. A questão disso é simples: como os terrenos estão escassos, as construtoras erguem imóveis cada vez menores, onde cabem mais gente, e obtém lucro fácil. Assim, mais pessoas se aglomeram em uma determinada região. Isso logicamente acaba sobrecarregando os serviços públicos de uma maneira geral.

Quando o Estado não organiza o caos, o caos se instala. É óbvio que o ônibus e o metrô estão saturados. Com mais pessoas indo para os mesmos lugares e ao mesmo tempo, pegar um ônibus é quase como pagar seus pecados, com a diferença de que é preciso desembolsar 3 reais para isso. E ao usuário não resta muita opção. Em alguns países da Europa (não sei se são todos), quanto mais crédito você recarrega em um cartão estilo Bilhete Único, mais desconto ganha. No metrô de São Paulo até tem um negócio parecido, chamado Cartão Fidelidade, mas sem a integração com os outros tipos de transportes o cartão é inútil para boa parte da população.

A verdade é que o aumento do ônibus vai muito além dos 3 reais. O repasse dos subsídios às empresas deve passar de R$ 660 milhões em 2010 para R$ 743 milhões este ano. Essa grana seria apenas para bancar as passagens gratuitas e a meia entrada dos estudantes. A prefeitura ainda é obrigada a bancar as melhorias no sistema, como reforma nos pontos e manutenção de corredores de ônibus. A conclusão disso é que a única tarefa das empresas é a de deixar a grana entrar no caixa, já que não houve qualquer melhora nas linhas ou nos veículos.

Quem quer fugir disso tudo pode tentar pegar um carro. Mas é lógico que a especulação imobiliária também provoca aumento na quantidade de automóveis que trafegam em uma determinada região, logo o congestionamento tende a aumentar. E as medidas tomadas para evitar esse problema se mostraram inócuas. Kassab restringiu a circulação de caminhões pela cidade, além da implantação do rodízio para esse tipo de veículo, mas o efeito foi quase nulo. E no ano passado, a ampliação da Marginal Tietê custou nada menos que R$ 1,3 bilhão aos cofres estaduais e municipais, e nos sete meses que demorou para ficar pronta, já ficou saturada. Para piorar, sem o canteiro central para permeabilizar o solo, aumenta o risco de enchentes na marginal.

E não ajuda muito o fato do serviço de desassoreamento do Tietê retirar apenas 380 mil metros cúbicos de detritos por ano, quando o ideal é 1 milhão de metros cúbicos. Para piorar, o serviço deixou de ser feito pelo governo estadual de dezembro de 2006, quando terminaram as obras de rebaixamento da calha do rio, até outubro de 2008, quando o contrato teve início. Nesse meio tempo, o leito do Tietê recebeu uma média de 1,2 milhão de metros cúbicos de detritos por ano. Ou seja, as obras de alargamento e rebaixamento da calha, que custaram mais de R$ 1,5 bilhão e demoraram três anos para ficarem prontas, hoje é totalmente inútil.

Fora isso, de 2008 para 2010, os investimentos em ações antienchentes da prefeitura caíram 8,7%, de R$ 389 milhões para R$ 358 milhões, já corrigida a inflação. Sendo que, no ano passado, as receitas do município aumentaram 20,4% em comparação com 2009. No mesmo período, os gastos com publicidade saltaram de R$ 57,8 milhões para R$ 108,9 milhões.


OBS: Esse texto não tem nada a ver com Movimento Zeitgeist ou com o filme. É apenas resultado de uma coleção de notícias que fui recolhendo por aí sem muita pretensão
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