Lost acabou. Algumas pessoas estão felizes, outras não. Algumas acharam legal ter acabado porque estavam de saco cheio, outras gostaram do fato da série ter tido oportunidade de ter um ponto final. Outras acharam filhadaputagem o enredo final ou o simples fato de ter de dizer adeus à série, independente da forma como ela acabou.
Acho que estou no meio termo. Foi muito bom ver a série sobreviver à greve de roteiristas que colocou em xeque vários enlatados lá em 2008 (lembram?), e realmente, há muita criatividade da parte dos criadores e roteiristas. Mas eu não gostei do fim.
Depois de assistir o episódio final de 2 horas via live broadcast lembrei imediatamente da cena final de o Show de Truman. Não, a ilha não era um estúdio de tamanho extraordinário que pode ser visto do espaço. Estou me referindo ao número de pessoas que parou para assistir esse tão esperado episódio. Talvez também houvesse gente assistindo da banheira, mas acho que não.
O ponto é exatamente esse. Lost é um fenômeno da TV. Pessoas do mundo inteiro assistem. Isso significa que Lost foi uma série sensacional? Se você pensar em números e rentabilidade sim. Mas daí pra afirmar que Lost mudou a maneira de assistir TV já é um pouco de exagero. Talvez isso tenha acontecido no Brasil, onde as pessoas eram obrigadas a esperar dois meses por um episódio inédito de uma mesma temporada. Mas garanto que nos Estados Unidos as pessoas ainda assistem TV do mesmo jeito: com a bunda colada no sofá. Lost deve ser creditado como um pioneiro, mas isso não é reflexo apenas da qualidade da série.
Aqui no Brasil, por exemplo, tantas outras séries são tão disputadas para download quanto Lost. Prison Break, Heroes, House e tantas outras também tem (ou tiveram) bom público aqui. E para se ter uma noção global, Heroes é uma série com mais busca por torrent que Lost. Acontece que Lost tem um apelo gigante na mídia brasileira. A Globo tem os direitos mas não passa. O AXN só acertou a mão nessa última temporada com relação à datas de transmissão. Caiu na internet e pouco tempo depois foi parar em revista e jornal. Eu francamente não consigo me lembrar quantas capas e Super Interessante e o Link do Estadão não foram dedicadas a Lost. Ou seja, Lost pode ser unanimidade no Brasil, mas para cada público um gosto.
É interessante! Heroes é a série mais baixada no mundo, e foi cancelada. Nos Estados Unidos, onde o número de pessoas que assistem realmente conta, não era tudo isso. Prison Break tinha roteiristas fodidos de bom. As duas primeiras temporadas da série tinham ganchos (o que liga um episódio ao próximo) espetaculares. Inteligente pra caralho. Aí teve a greve dos roteiristas e foi queda livre. Mudaram uma cena final e o que seria o gancho da próxima temporada foi substituído pelo fim da série. Com Heroes é a mesma coisa. Sofreu o impacto da greve, a história foi piorando cada vez mais e agora não existe mais. E ainda assim, sem planejar, o final de Heroes ficou mais convincente que o final de Lost. Lost passou pelos mesmos problemas que as outras séries, mas teve a chance de se redimir. E isso eu achei legal.
Mas a grande sacada de Lost é ter ficado durante seis anos na TV discutindo bem e mal, carma, divinismo, flashbacks, flashforwards, eletromagnetismo, viagem no tempo, universos paralelos e todo tipo de ciência que gerou todo tipo de discussão entre nerds, geeks ou simples e fiéis seguidores (o que deve se encaixar entre nerds ou geeks).
E no fim, o que prende o espectador é a simples e pura emoção do drama, com uma sacada genial de subjetividade. Cada pessoa ficou com sua teoria do que foi Lost. Não faz meu tipo. Mas tiro o chapéu.
24 de maio de 2010
23 de maio de 2010
17 de maio de 2010
5 de maio de 2010
Alice e a Fabulosa Máquina de Destruir Clássicos
A melhor moral que podemos tirar do novo filme da Alice é: nunca subestime a indústria do cinema. A coqueluxe que causou o simples fato de uma das historias mais legais da literartura ser filmada pelo Tim Burton, o mestre da estética visual do bizarro e da loucura, não está escrito, embora fosse imaginado. Queira ou não, Tim Burton era o cara certo para fazer essa adaptação. O problema é que talvez nem ele nem o público esperassem que o clássico de Lewis Carrol fosse reduzido a um monte de clichês pasteurizados no melhor estilo hollywoodiano.
O legal na história de Alice, o original, é tanto o nonsense e a insanidade do enredo – que, dizem as más línguas, influenciou os surrealistas e a galera da psicodelia dos anos 60 – quanto seu texto muitíssimo bem trabalhado, cheio de referências históricas, com uma pitada do humor inglês vitoriano e com uma absurda lógica matemática. Mas tudo isso se perdeu quando a Disney decidiu que era melhor criar uma outra história em cima dessa, e uma história muito mais fraca, diga-se de passagem.
A diferença mais visível é que Alice já não é mais uma garota de 7 anos, mas uma moça de 19 prestes a se casar. A partir dessa premissa, a roteirista (a mesma que escreveu Rei Leão e Bela e a Fera) resolveu brincar de futurologia: como seria Alice e o País das Maravilhas 12 anos depois dela ter caído no buraco? A princípio a ideia de fazer algo diferente é até boa, visto que todo mundo já deve conhecer a história e que o que não falta são adaptações para o cinema, mas a execução foi primária. Alice deixou de ser a menina curiosa que se deixa embarcar em um sonho psicodélico com coelhos falantes, gatos que evaporam ou lagartas fumadoras de nargilé. Agora, ela tem uma missão, seguindo a velha cartilha da Jornada do Herói, de Joseph Campbell. E para cumpri-la, precisa passar por um estágio de provação e mudar sua psique interior. Isso quem diz não sou eu, mas os próprios personagens do filme.
Voltando então ao livro. A Alice original era tremendamente esperta e contestadora, mas educada, e isso fazia parte de sua própria característica. Tanto que, embora todo o universo do País das Maravilhas fosse um mero sonho, paradoxalmente ela buscava um sentido lógico em tudo. E é nesse paradoxo que se estabelece a graça da obra. Tanto que um dos melhores capítulos do livro, quiçá da literatura juvenil mundial, é a do chá das cinco, em que Alice tenta estabelecer um diálogo com a Lebre de Março, o Chapeleiro Maluco e o Dormindongo, até que ela fica tão impaciente com a loucura deles que resolve sair de rolê. Parece até uma esquete do Monty Python de tão insano que é o negócio.
Esse tipo de humor do absurdo se perdeu na adaptação. Alice e os personagens do País das Maravilhas transparecem um ar carregado de melancolia, e tudo por causa da tirania da Rainha Vermelha. Aparentemente, só com a derrubada do seu regime que a alegria voltará a reinar nessas terras. Ora, pura patifaria. Nada disso impede um piadinha de efeito ou uma sacada irônica. Só para exemplificar, na época da ditadura militar surgiram mentes brilhantes no Brasil que usavam o humor para contestar a repressão do governo, como o Henfil, o Angeli e os irmãos Caruso. Esse tipo de reducionismo pode funcionar para crianças, mas para adultos, que eram a esmagadora maioria na sessão lotada em que fui em uma tarde chuvosa de domingo em São Paulo, isso beira o revoltante. Pelo menos, foi o que pensei.
Para não dizer que não falei das flores, Alice tem seus pontos altos. Apesar de tudo, a estética burtiana é do caramba. Quando se trata de personagens excêntricos, que transitam entre mundos sombrios e tenebrosos, estamos falando com o cara certo. Mas o problema é quando isso fica só no visual e se esquece do desenvolvimento do enredo, como se fosse um Avatar surrealista. É legal ver os efeitos em 3D e o cenário fantasioso, mas como fica a história? O que deveria ser o principal o pessoal resolve deixar de lado.
É preciso destacar também Mia Wasikowska, que ficou muito bem como a contestadora Alice, embora não convença fazendo cenas de ação; Johhny Depp, que mais uma vez fez como ninguém o papel de louco (se bem que ele só faz papel de louco); e Helena Bonham Carter, que mandou muito como a Rainha Vermelha.
O caso é que Hollywood perdeu uma oportunidade de ouro de fazer uma filme pra ficar na história. Ao invés disso, resolveram subestimar a inteligência do público e enterrar qualquer brilhantismo do livro do Lewis Carrol. Mesmo assim, Alice foi a maior bilheteria da Disney no Brasil. Nunca subestime a indústria do cinema.
O legal na história de Alice, o original, é tanto o nonsense e a insanidade do enredo – que, dizem as más línguas, influenciou os surrealistas e a galera da psicodelia dos anos 60 – quanto seu texto muitíssimo bem trabalhado, cheio de referências históricas, com uma pitada do humor inglês vitoriano e com uma absurda lógica matemática. Mas tudo isso se perdeu quando a Disney decidiu que era melhor criar uma outra história em cima dessa, e uma história muito mais fraca, diga-se de passagem.
A diferença mais visível é que Alice já não é mais uma garota de 7 anos, mas uma moça de 19 prestes a se casar. A partir dessa premissa, a roteirista (a mesma que escreveu Rei Leão e Bela e a Fera) resolveu brincar de futurologia: como seria Alice e o País das Maravilhas 12 anos depois dela ter caído no buraco? A princípio a ideia de fazer algo diferente é até boa, visto que todo mundo já deve conhecer a história e que o que não falta são adaptações para o cinema, mas a execução foi primária. Alice deixou de ser a menina curiosa que se deixa embarcar em um sonho psicodélico com coelhos falantes, gatos que evaporam ou lagartas fumadoras de nargilé. Agora, ela tem uma missão, seguindo a velha cartilha da Jornada do Herói, de Joseph Campbell. E para cumpri-la, precisa passar por um estágio de provação e mudar sua psique interior. Isso quem diz não sou eu, mas os próprios personagens do filme.
Voltando então ao livro. A Alice original era tremendamente esperta e contestadora, mas educada, e isso fazia parte de sua própria característica. Tanto que, embora todo o universo do País das Maravilhas fosse um mero sonho, paradoxalmente ela buscava um sentido lógico em tudo. E é nesse paradoxo que se estabelece a graça da obra. Tanto que um dos melhores capítulos do livro, quiçá da literatura juvenil mundial, é a do chá das cinco, em que Alice tenta estabelecer um diálogo com a Lebre de Março, o Chapeleiro Maluco e o Dormindongo, até que ela fica tão impaciente com a loucura deles que resolve sair de rolê. Parece até uma esquete do Monty Python de tão insano que é o negócio.
Esse tipo de humor do absurdo se perdeu na adaptação. Alice e os personagens do País das Maravilhas transparecem um ar carregado de melancolia, e tudo por causa da tirania da Rainha Vermelha. Aparentemente, só com a derrubada do seu regime que a alegria voltará a reinar nessas terras. Ora, pura patifaria. Nada disso impede um piadinha de efeito ou uma sacada irônica. Só para exemplificar, na época da ditadura militar surgiram mentes brilhantes no Brasil que usavam o humor para contestar a repressão do governo, como o Henfil, o Angeli e os irmãos Caruso. Esse tipo de reducionismo pode funcionar para crianças, mas para adultos, que eram a esmagadora maioria na sessão lotada em que fui em uma tarde chuvosa de domingo em São Paulo, isso beira o revoltante. Pelo menos, foi o que pensei.
Para não dizer que não falei das flores, Alice tem seus pontos altos. Apesar de tudo, a estética burtiana é do caramba. Quando se trata de personagens excêntricos, que transitam entre mundos sombrios e tenebrosos, estamos falando com o cara certo. Mas o problema é quando isso fica só no visual e se esquece do desenvolvimento do enredo, como se fosse um Avatar surrealista. É legal ver os efeitos em 3D e o cenário fantasioso, mas como fica a história? O que deveria ser o principal o pessoal resolve deixar de lado.
É preciso destacar também Mia Wasikowska, que ficou muito bem como a contestadora Alice, embora não convença fazendo cenas de ação; Johhny Depp, que mais uma vez fez como ninguém o papel de louco (se bem que ele só faz papel de louco); e Helena Bonham Carter, que mandou muito como a Rainha Vermelha.
O caso é que Hollywood perdeu uma oportunidade de ouro de fazer uma filme pra ficar na história. Ao invés disso, resolveram subestimar a inteligência do público e enterrar qualquer brilhantismo do livro do Lewis Carrol. Mesmo assim, Alice foi a maior bilheteria da Disney no Brasil. Nunca subestime a indústria do cinema.
2 de maio de 2010
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