
Pretensioso que sou, estava para escrever esse post antes da virada do ano, mas por um capricho da natureza acabou saindo somente agora. Bom, a idéia aqui é pegar os cinco discos que eu ouvi pela primeira vez em 2007 (ao estilo Alta Fidelidade), com suas devidas críticas e seus comentários:
5. Novos Baianos - Acabou Chorare (1972)
Fazer listas ordenadas e criteriosas é sempre um problema, vide esta ao qual escrevo. Por isso, recebi com algum ceticismo a matéria da Rolling Stone que lista os 100 maiores discos da música brasileira. Acabou Chorare, segundo álbum dos Novos Baianos, lançado em 1972, ficou com a primeira colocação, deixando para trás Tropicália ou Panis et Circenses (2º) e Chega de Saudade, de João Gilberto (4º). Um fenômeno, eu diria.
Mas de qualquer modo, resolvi ouvir o disco e constatar com meus próprios ouvidos, e acabei reconhecendo a qualidade do álbum.
Acabou Chorare começa com duas músicas de sucesso: "Brasil Pandeiro" e "Preta Pretinha". A primeira foi composta originalmente nos anos 40, e foi indicada pelo pai da bossa nova e padrinho da trupe, João Gilberto. A segunda foi escrita por Luiz Dias Galvão para uma moça que ele conhecera no Rio de Janeiro e tocou sem parar nas rádios, assim como a faixa-título, "Acabou Chorare". Outros destaques são "Besta é Tu", "Swing de Campo Grande" e "Mistério do Planeta", que exibem a criatividade de Moraes Moreira na criação de melodias.
É interessante ressaltar que o álbum marcou uma época de transição musical dos Novos Baianos, em que eles deixaram a pegada rock mais de lado e, graças a João Gilberto, começaram a fazer experimentações dentro de ritmos nacionais, mais notadamente na bossa nova e no samba. Lembrando que, nessa época, havia uma rivalidade entre os partidários da tropicália e da bossa nova, e os Novos Baianos conseguiram transitar como ninguém pelas duas vertentes.
Mas, mesmo assim, é difícil dizer se a primeira colocação é merecida. Como diz o texto da Rolling Stone, essas listas são reflexos da época atual e da maneira como vemos o passado. E com todo esse revival setentista, acabou sendo natural a consagração de Acabou Chorare, um disco de altíssima qualidade e envolto por um grande hype.
4. Radiohead - In Rainbows (2007)
A jogada do Radiohead foi perfeita para o lançamento de seu sétimo álbum, In Rainbows. Chamaram a imprensa e anunciaram como divulgariam o trabalho: entre outubro e dezembro, qualquer pessoa poderia baixar o CD e pagar o valor que quisesse, inclusive zero real - o popular, na faixa. Nessa brincadeira, eles arrecadaram 3 milhões de libras só em downloads - o maior lucro da história da banda, sendo maior que a soma de todos os outros seis discos juntos. Isso porque o CD físico foi lançado só no começo de janeiro.
Para aqueles que resolveram contribuir pagando pelo download do álbum (não foi o meu caso), certamente valeu a pena. Segundo a imprensa especializada, o álbum é um dos melhores desde Ok Computer, a obra-prima do Radiohead. E, como em todos os CDs anteriores, eles conseguiram inovar novamente, porém deixando aquela marca inconfundível da banda.
Exemplo disso é a música que abre o álbum, "15 Step", que começa somente com samplers, dedilhadas na guitarra e a voz de Thom Yorke. À primeira vista nem parece Radiohead, mas com a entrada hipnotizante do teclado, próximo do fim da faixa, notamos o contrário.
Depois vem "Bodysnatchers", uma música ao estilo grunge psicodélico-caótico, com efeitos sujos na guitarra e nos vocais. Mais para frente temos "Weird Fish / Arpeggi", excelente canção progressiva que vai crescendo de intensidade aos poucos - começa com bateria, baixo e guitarra - até cessar e entrar em um grandioso solo.
A "House of Cards", uma das melhores do álbum, é uma baladinha de amor envolta de muito psicodelismo, efeitos eletrônicos e de um riff simples. Na canção seguinte, "Jigsaw Falling Into Place", eles novamente voltam a se basear no grunge.
Por fim, em "Videotape", a curiosidade fica por conta da semelhança da música com as do Coldplay, que por outro lado sofreu inspiração do próprio Radiohead. Em outras palavras, a criatura inspirou seu criador.
3. Vanguart - Vanguart (2007)
"Com ousadia, Vanguart vai da folk music à psicodelia". Foi com essa manchete, do Folha Online, que fui fisgado a conhecer essa excêntrica banda de Cuiabá (MT). Afinal, os caras misturam duas coisas ao qual aprecio musicalmente: a batida rancheira do folk, representada por Bob Dylan e Neil Young, e a construção musical bem trabalhada do rock progressivo, como do Pink Floyd. E toda essa mescla dá certo.
Não é a toa que os caras alçaram rápido a condição de grandes nomes do rock brasileiro atual, tocando no Tim Festival e até na Rede Globo. O som é de qualidade, a vocal de Hélio Flanders é de arregaçar e as composições são tocantes, tanto em português quanto em inglês ou espanhol.
O CD, distribuído pela revista OutraCoisa (aquela do Lobão), abre com "Semáforo", uma das melhores e mais conhecidas deles. Começa somente com o violão, bateria e voz, mas com o decorrer da música, baixo e guitarra entram e ganham espaço, com uma letra que beira o delírio. Depois segue o mais puro folk-rock com pitadas de punk em "Just to see your Blue Eyes see", e a country "Hey Yo Silver". Outros destaques são a latina psicodélica "Los Chicos de Ayer", a balada "Enquanto Isso na Lanchonete" e a incógnita "Cosmonautas".
Um fato interessante é que todas as músicas são diferentes uma da outra. "Cachaça", por exemplo, tem uma cara de canção pop com algo de rock dos anos 70, enquanto que "The Last Time I Saw You" lembra muito Bob Dylan, com um violão dando o ritmo preciso. Isso, logicamente, é fruto da gama das (boas) influências musicais da banda, como Beatles, The Beach Boys, Velvet Underground, Nick Drake e Raul Seixas. O resto é consequência.
2. Gotan Project - La Revancha del Tango (2001)
Em 2007, o trio franco-suíco-argentino Gotan Project fez duas apresentações no Brasil - ambas memoráveis, segundo a imprensa. Na primeira delas, em junho, fiquei curioso em conhecer uma banda que recebeu tantos elogios e destaque na mídia. Misturando tango (vem daí o nome Gotan) com ritmos eletrônicos, a sonoridade é única, com belos arranjos tirados do bandoneón, do violão, do piano, outros intrumentos de cordas e de samplers.
No disco de estréia, La Revancha del Tango, a mistura eclética de ritmos criou um som envolvente e, por vezes, dançante. Os solos do bandoneón são dignos de um solo de jazz (bem ao estilo Piazzola), enquanto que a base criada pelas batidas, pelos efeitos eletrônicos, pelo violão e pela marcação do baixo criam um clima de contemplação.
Apesar dos intrumentos darem vidas às músicas, o vocal de Verônika Silva ajuda a completar a harmonia. Em "Una Música Brutal", ela demonstra alguma sobriedade, deixando a emoção de lado. Já em "Vuelvo Al Sur", a canção que fecha o álbum, sua voz aparece repentinamente aos 3min28s, cantando com imponência: "Vuelvo al Sur / como se vuelve siempre al amor".
Também se destacam as músicas "Queremos Paz", "Santa Maria (Del Buen Ayre)" e "El Capitalismo Foraneo", além das covers "Chunga's Revenge", de Frank Zappa, e do filme "Last Tango in Paris".
De fato, o álbum consegue atrair a atenção tanto de quem não é fã de música eletrônica, quanto de quem nunca se interessou muito por tango - como é o meu caso. Acho que mesmo para os mais puristas, a experiência é, no mínimo, interessante.
1. Arcade Fire - Neon Bible (2007)
Quando surgiu na mídia, em 2005, o Arcade Fire mostrou que era muito mais que uma banda alternativa, vinda de um país alternativo no cenário musical (Canadá). Eles mostraram que tinha qualidade e inovações para mostrar. Uma delas é que os sete membros tocam praticamente todos os instrumentos. É como se o Carrossel Holandês de Rinus Michels fosse aplicado em uma banda. Isso sem falar na sonoridade sem equivalentes de suas canções, graças as influências musicais que vão do pós-punk dos anos 80, passam pelo o folk-rock e pelo rock experimentalista dos anos 70 e desembocam nas bandas alternativas contemporâneas, como Sonic Youth, Radiohead e Belle & Sebastian.
Por isso, a expectativa com o lançamento do segundo álbum da banda, Neon Bible, era grande. Mas mesmo sentindo a pressão que era preceder Funeral, o aclamado disco de estréia, eles parecem nem ligar para isso. A sonoridade continua complexa, com o acréscimo de um órgão, uma sanfona (de corda) nos intrumentos, uma orquestra sinfônica inteira, entre outros. O resultado são músicas menos catárticas e depressivas, como em Funeral, e mais bem trabalhadas sonoricamente.
Um dos resquícios dessa época é "Black Mirror", que abre o álbum. A canção possui uma letra sombria, assim como a harmonia carregada dos instrumentos, mas ao fim a música começa a ganhar imponência e força. Depois vem "Keep the Car Running", uma das melhores do álbum. Os acordes da sanfona de corda e a marcação pelas batidas de palmas e pelo baixo são simples mas perfeitos, e o tempo acelerado da bateria parecem realmente fazer a música correr.
A lado mais dark e dramático do Arcade Fire retorna com a canção "Intervention", no qual o órgão é quem lidera os arranjos. A letra é forte, inspirada na situação calamitosa do Haiti, onde nasceram os pais da vocalista e instrumentista Régine Chassagne: "We can’t find you now / But they’re gonna get their money back somehow / And when you finally disappear /
Will they say you were never hear?"
Mais para frente temos "The Well and the Lighthouse", uma música muito bem trabalhada e que alterna um começo rápido e frenético com um fim mais melódico e lento. Em seguida, está "(Antichrist Television Blues)", mais uma canção cheia de nuances e com fino trato na parte dos arranjos instrumentais e vocais.
A penúltima música é "No Cars Go", também uma das melhores do álbum e exibe o lado mais puro rock da banda, sendo rápido, sem muita frescura mas com um belo trabalho de arranjo. E para fechar o CD, a canção mais depressiva: "My Body is a Cage", tocada quase que totalmente no órgão.
Uma vez mais, o Arcade Fire mostrou, com criatividade e estilo próprio, porque se mantém como uma das melhores bandas da atualidade, e que seus discos já se tornaram verdadeiros clássicos na história da música.
Menção Honrosa:
Velvet Underground - Velvet Underground & Nico (1967)
Não há muito o que falar desse álbum, tão revolucionário para a música que é uma pérola de 1967, juntamente com Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band, dos Beatles, e The Piper at the Gates of Dawn, do Pink Floyd. Apenas leia e ouça.
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