Apesar de toda a expectativa contrária, pelo menos da minha parte, a decisão já era esperada. Dentro dos tribunais, representantes da indústria fonográfica ganham de goleada da turma pró-download. O pioneiro Napster foi também um dos primeiros a experimentar o que é ser intimado pelas gravadoras. Em 1999, época em que a conexão discada era a lei, o criador do programa, Shawn Fanning foi condenado por violar copyrights e seu servidor foi fechado. Alguns anos depois, o Napster retornou das cinzas, mas totalmente desfigurado (pago e servindo de capacho da indústria), como se tivesse sofrido uma lobotomia. Limewire, Grokster, Morpheus e outros programas P2P também não tiveram muita sorte nos julgamentos e tiveram que ser desativados. Recentemente, no Brasil, a comunidade Discografias não aguentou a pressão das majors e teve que ser fechada -mas parece que está retornando aos poucos.
O caso do Pirate Bay tinha tudo para integrar essa lista -e de fato integrou. Mas a sagacidade dos réus levou esse julgamento a um novo patamar. Se o motor do site era a coletividade, nada mais lógico que os usuários ajudarem conjuntamente na defesa do site. Uma das ofensivas começou com a criação de um blog para acompanhar o andamento do caso, só que tudo narrado de um jeito muito sarcástico, como se tudo o que acontecesse lá fosse fruto de um grande circo -o que não deixa de ser verdade. Só é uma pena que boa parte dos textos tenha sido deletada.
Durante o processo, ficou evidente a ignorância das gravadoras quando o assunto é internet. O Pirate Bay teve até que chamar um especialista para explicar como funciona o sistema Bittorrent, explicando o porquê deles não poderem ser considerados culpados pelos downloads ilegais e que sua extinção não significaria o fim dos downloads. Seria o mesmo que acusar o Google de incitar a violação de direitos autorais só porque divulga links de sites de mp3. Coisas da web 2.0.
Para exemplificar melhor esse quadro e ainda fazer uma graça, a defesa usou o bizarríssimo argumento King Kong, que foi bastante comentado nos blogs: "É preciso haver uma ligação entre os perpetradores do crime e os usuários. Esta ligação ainda não foi comprovada. O promotor precisa mostrar que Carl Lundström (um dos criadores do PB) interagiu pessoalmente com o usuário King Kong, que pode muito bem ser encontrado nas selvas do Camboja". Pelo que eu li por aí, qualquer relação com a tese Chewbacca, do South Park, não é mera especulação.
Do outro lado, John Kennedy, presidente do grupo de gravadoras que entrou na justiça, deu seus argumentos contrários à distribuição ilegal de músicas na internet. Ele disse que as vendagens de CDs caíram, nos últimos dez anos, de US$ 27 bilhões para US$ 18 bilhões. Em 2001, o CD mais vendido daquele ano tinha comercializado 13 milhões de unidades, enquanto que, em 2008, o campeão Coldplay havia vendido só a metade disso. Certamente, a culpa é das pessoas que baixam arquivos pela internet e não a incompetência estratégica da indústria. Faltou pouco para o pessoal do tribunal passar uma sacolinha de doações para as pobres majors.
Este é o fim?
É chover no molhado dizer que a indústria fonográfica está em uma eterna crise. Acho que os fatos dizem por si. Mas não exatamente uma crise econômica, como se pode ver, e sim uma crise de identidade. Desde o começo da década, os analistas mais conservadores já davam como certo o fim da mídia física. Com o advento da banda larga, as coisas só pioraram para o lado dos produtores. Porém, ao que tudo indica, as gravadoras ainda estão aí, firmes e fortes.
É fato dizer que as gravadoras ainda vendem discos por causa de alguns poucos puristas, como eu, que preferem ouvir músicas em seu estado de natureza (entenda-se Lossless) a mp3 ultracomprimidos de 128 kbps, que conseguem fazer o prato de uma bateria soar como um "tssss" constante. Só isso pode explicar, já que os artistas não ganham nada por vendagem de discos mas por royalties, e mesmo assim eles ainda conseguem ser roubados. Portanto, comprar disco original só porque gosta da banda é um grande erro de lógica.
O fato é que as gravadoras precisam mirar no público certo, e o público certo é aquele que compra discos pela qualidade do produto e não porque está na moda, como se fazia anteriormente. É aquele mesmo cara que pode ficar horas discutindo a qualidade superior do vinil sobre o CD, ou que pretende trocar toda a sua coleção de DVD pela de Blu-ray. Nesse sentido, comercializar discos de qualidade superior, como a EMI pretende fazer com a remasterização do catálogo dos Beatles, é uma boa para ganhar uma sobrevida -inclusive quando se sabe que na internet já rolam arquivos em FLAC de alta qualidade dos LPs dos Fab Four que dão uma surra nos CDs lançados em 1987. E para o resto da patota, o negócio é investir em downloads pagos.
Confesso que até eu ri quando surgiu essa história de pagar para baixar músicas, mas hoje vejo que é um negócio tão louco que pode até dar certo. O Radiohead, o iTunes e o site Trama Virtual mostraram que isso é possível, cada um usando seu modelo, o que dá margem para a criação de outros métodos de comercialização via internet.
Agora, o que é imoral é o fato das majors investirem pesado para coibir a distribuição de músicas, sejam elas pagas ou não, e tratarem os usuários como criminosos periculosos, como faz nosso amigo abaixo.
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