22 de dezembro de 2007
Universo alternativo
Mais alternativo que isso impossível.
Com destaque para os jogadores Cabecinha e Maloca, independente da habilidade futebolística e do time que jogam.
Comentário: isso corrobora a tese de que o fim de ano é uma época de surgimento de buracos-negros na televisão brasileira.
Update:
Romário está fazendo escola. Batata, jogador e técnico do Xavantes, entrou em campo com dez minutos para o término da peleja. O time de nome indígena ganhou do time de nome italiano por 2 a 0.
17 de dezembro de 2007
Lembranças de um passado não tão remoto
Entramos no nosso quarto. Retirei o telefone do gancho e pensei por alguns segundos.
- Você se lembra qual o número do quarto dela? - perguntei ao interlocutor.
- Pô, acho que é 610*, mais ou menos - respondeu ele.
- Hmm... Se eu não me engano, é número impar - completei.
Liguei para o 611*:
- Alô - disse uma voz feminina do outro lado da linha.
- Alô, aí é o quarto da Lívia?
- Não.
- Ah, obrigado.
Tentei o 613*:
- Alô - novamente uma garota atendeu.
- A Lívia está por aí?
- Não tem nenhuma Lívia nesse quarto, senhor.
Liguei para todos os números ímpares seguintes, até o 621*. Nenhum deles era o quarto dela. Reconheci meu fracasso e decidi que a deixaríamos para trás -- até porque essa era a nossa única opção.
Perto do hall de entrada, nós a avistamos junto com o resto do pessoal.
- Mas afinal, qual o número do seu quarto? - perguntei para ela, depois de explicar a situação ridícula que nos envolveramos há pouco.
- 612*.
De fato, a vida prega algumas peças na gente, pensei.
*os números não correspondem à realidade. Eles foram inventados pela Matrix.
Procedimento padrão
- Igor Nishikiori.
- Igor o quê!?
- Ni-shi-ki-o-ri.
- Er... Soletra para mim, por favor.
- N de navio, I-S-H-I-K-I-O-R-I
- Ok... Dá uma olhada aqui para ver se está certo.
- Sim, está certo. Mas Igor se escreve com "i", meu caro.
15 de dezembro de 2007
Também tenho um Twitter
Certas novidades da internet são certezas absolutas de sucesso. O PornoTube é uma delas. Outras demoram para engrenar, como foi o caso dos blogs e do Wikipédia. A mais recente onda do momento no ciberespaço é o Twitter, que parece ser um meio termo dos dois casos -- pois é conhecido, mas poucos se aventuraram até agora.
Para quem não sabe, o Twitter é uma espécie de microblog, em que o usuário pode postar micromensagens através do celular ou de outros meios mirabolantes. A graça do negócio é que você pode escrever detalhadamente todos os fatos do seu cotidiano, segundo comentam os experts no assunto.
Confesso que só há poucos meses eu tinha ouvido falar nisso aí. Digamos que a idéia é até interessante, porém não é nova. No Japão, isso já existe há um bom tempo -- aliás, não há nada que os japoneses não possam fazer com um celular em mãos, mas isso é assunto para um outro tópico.
O fato é que os americanos importaram essa idéia e exportaram para o mundo com grande frisson. Mas o problema era: qual seria a real utilidade disso? Acabaram inventando que era para contar todos os passos da o seu dia-a-dia, e que isso era muito legal.
Talvez até seja, sei lá. Não custa tentar. Pessoas bacanas estão montando Twitters, como o Mr. Manson -- embora o dele tenha um caráter mais anárquico, o que possivelmente me incentivou a entrar nessa parada. Além disso, na cibercultura, atrás de uma coisa aparentemente inútil costuma surgir coisas úteis, como foi o caso dos blogs e do Orkut. De fato, o retrospecto é animador.
Mas, à primeira vista, animação foi tudo o que eu não encontrei no Twitter. O cadastro é simples, mas o layout é porco. Na verdade, acho que eles pensaram em dar uma cara de simplicidade ao serviço, como o Orkut nos velhos tempos, mas certamente erraram na mão. Lógico que isso é o de menos, já que este belo blog também não prima pela excelência de um design italiano.
O que realmente peca no Twitter é sua funcionalidade. O fato de ter de pagar para postar mensagens via celular é um péssimo atrativo. E ter que entrar no site cada vez que for postar alguma coisa é um pé no saco. Sem falar no limite de 140 caracteres. Não consigo fazer uma linha fina menor do que isso, imagina postar uma mensagem.
Essa limitação faz com que tudo seja muito seco e raso no Twitter. Nada de comunidades bizarras, textos inteligentes ou vídeos toscos. Só coisas do tipo: "Vou jantar macarrão" ou "vou para o shopping". Na verdade, isso mais parece um status do MSN do que um microblog. Ou uma máquina de afagar o ego -- característica que pode levar o negócio à cucuia. Alguém aí ainda se lembra do Fotolog?
Para contornar essa chatice, tentei colocar algum aplicativo para o Twitter -- tal qual fez o Mr. Manson, que deixou à mostra todas as suas buscas do Google. Como sou menos radical do que ele, instalei um aplicativo para o Firefox que faz as postagens das músicas tocadas no iTunes e das coisas que assisto no YouTube. Para quem quiser instalar, é só clicar aqui.
Agora só resta saber quanto tempo essa coisa vai ficar de pé. Não dou mais de um mês.
6 de dezembro de 2007
A primeira noite no Inferno - pt.3 (ou Como dizer a coisa certa na hora errada)
Naquela altura, já passava das 4h e meu corpo estava em cacos. Talvez porque a cerveja long-neck de cinco mangos finalmente começou a bater dentro do meu organismo. Ou talvez porque estávamos bebendo ininterruptamente desde às 19h. Em condições assim, é natural que o cérebro funcione através de lapsos de consciência, e faça com que o corpo pare de responder por algum tempo.
Acho que meu cansaço era evidente. Enquanto os meus amigos saíram para tirar mais fotos do público, fiquei encostado em uma parede do lugar – onde me tornei alvo de garrafadas no tornozelo. Em dado momento, aquela garota da foto surgiu novamente do nada e veio em minha direção. Ela me deu um chacoalhão e fez uma pausa, talvez esperando algum tipo de reação. Mas o fracasso era evidente: mal conseguia lembrar seu rosto, ainda mais assimilar o que estava acontecendo. Visivelmente abatida, ela foi em direção ao banheiro, de onde nunca mais voltou.
A segunda banda subiu ao palco. Seu nome era Identidade, do Rio Grande Sul, falou ao microfone o vocalista. A verdade é que eu já não estava com mais pique de acompanhar o show. Meus pensamentos voavam para longe daquele lugar – acho que aqueles chacoalhões me fizeram mal. Mas digo que o som não é de todo o ruim, tem algo de dançante que lembra Franz Ferdinand – porém com letras ruins, bem ao estilo anos 80. Mas nada que empolgasse tanto, já que foram poucos aqueles que permaneceram até o fim do show. Nós, por exemplo.
Pensava que a noite se encerrara ali, mas estava bastante equivocado. O último ato dessa tragicomédia ocorreu em um outro bar da Augusta, alcunhado Bar Bahia. O local era visivelmente insalubre, mas isso pouco importava. A minha fome estava insustentável, e logo pedi um x-salada. O fotógrafo me acompanhou e o outro elemento pediu uma cerveja.
O recinto onde estávamos não era dos piores – já pisei em locais muito mais insanos do que aquele. Mas luxo certamente era um artigo dispensável. Ao fundo do bar, uma mesa de sinuca e um jukebox faziam a alegria de alguns. Lá também se encontrava uma máquina de karaokê, aparentemente desativada. A televisão, sintonizada no campeonato mundial masculino de vôlei, era o nosso único atrativo. Isso até ela chegar.
Vanessa apareceu de repente, querendo cigarro e alguma atenção. Era loira, estatura baixa, olhos claros e tinha uma voz embriagada. Ela exalava líbido pelos seus poros, e de sua boca saía as mais absurdas histórias. Dizia ela que era casada com um australiano e que suas amigas seguiram rumo semelhante, viajando com a gringalhada. Foi a única coisa com algum sentido lógico que consegui pescar na conversa.
Mas era o óbvio ululante: Vanessa é uma meretriz (o popular, mulher do pala aberto). Se não é, eu a aconselharia a mudar alguns trejeitos. Para começar, ela parecia ter uma fixação pelo Gilmar, um dos funcionários do local, que compreensivelmente tentava se esconder atrás do balcão. Além disso, ela se entrosava com qualquer homem que olhasse acidentalmente em sua direção. Foi o nosso caso.
Já estávamos na terceira garrafa de cerveja quando Vanessa começou a se abrir para a gente. No início, ela só repetia insistentemente "quero cantar, quero cantar", e balbuciava palavras aparentemente sem ligação sintáxica, como um Riobaldo da grande metrópole. Ela se esquivava de perguntas, como "com o que trabalhava?" e "o que gosta de fazer?", com uma divina retórica malufista. Beber e dançar foi o que ela respondeu, respectivamente.
Mas alguns copos depois, ela quase fez uma performance instantânea para a gente. Após ouvir uma música no jukebox que lhe assanhou, Vanessa ameaçou tirar sua camisa branca, toda surrada e muito larga para o seu corpo, e tentou realizar um legítimo slap dance, ao sentar no colo do nosso amigo. Logo senti que a coisa estava esquentando. Restava saber qual dos dois daria o bote.
Já passava das 5h30 e precisávamos ir embora. Me levantei para pagar a conta, enquanto os dois ficaram lá conversando com Vanessa. Esse movimento me custou caro. Isso porque, enquanto eu assistia o Gilmar lutando ferozmente contra a máquina do Visa Electron, um diálogo digno de filme B hollywoodiano rolava na mesa:
- E aí, tá a fim de dar uns pegas? - perguntou nosso seduzido parceiro à divina dama.
- Claro, isso é o que eu mais quero - disse ela, com cara de safada.
- E quantos que é?
Essa frase doeu em Vanessa.
- Tá me achando com cara de puta? - disse histérica.
- Não. Estou falando da grana para o motel - argumentou ele, tentando consertar a cagada.
- Isso é problema seu.
Depois de ser degradada em plena Augusta, ela abaixou a cabeça sobre a mesa, como quem chora copiosamente. Nesse instante, eu já tinha pago a conta e achava que aquilo era só um sintoma da bebedeira. Mas o fotógrafo logo confidenciou: "Depois dessa, achei que ela ia chamar o cafetão, que iria vir esfaquear a gente". Por sorte, nada de grave aconteceu.
Esse diálogo me fez pensar como as relações humanas estão em seu nível mais baixo na história. Acho que nem na era feudal as mulheres eram tão degradadas assim. Afinal, se ela queria dar uns amassos de graça, porque diabos alguém se oferece para pagar pelo serviço? Uma total falta de tato. A frase "o inferno somos nós" nunca fez tanto sentido como agora.
4 de dezembro de 2007
A primeira noite no Inferno - pt.2
- O que você está escrevendo aí no caderninho?
- Sobre tudo - respondi.
- Ah, tá. Deve ser difícil escrever assim, nessas condições.
Antes que eu a ofendesse com alguma resposta cretina, perguntei se não queria tirar uma foto.
- Ah, mas não quero aparecer sozinha - disse ela.
- Você não veio acompanhada?- perguntei, sem malícia.
- Tô com ele - disse, apontando para um mané qualquer.
- Ah - respondi.
O casal se aproximou para tirar o retrato. Depois do clique, eu e o fotógrafo agradecemos e já dávamos meia-volta, quando ela me chamou novamente.
- Quero tirar uma foto com você - disse para mim, com um sorriso no rosto.
Olhei para o fotógrafo e ele gesticulou como se falasse "vai lá. Foda-se". Aproximei e tirei a foto com eles. Agradeci novamente e dessa vez foram eles quem deram meia-volta e sumiram na multidão. Confesso que aquela atitude ficou marcada por um tempo na minha cabeça. Principalmente depois do segundo encontro.
Mas, naquele instante, o que me incomodava mesmo era que o show não dava qualquer sinal de início. "Me disseram que começaria às 1h", tentou me acalmar o fotógrafo. Já passava das 2h, e nada. Meia hora depois, uma movimentação no palco prenunciou a apresentação.
O flyer não anunciava quem tocaria, apenas dizia que seriam duas bandas “surpresas”. E, de fato, foi – pelo menos, a primeira. Vanguart começou com uma música bem ao estilo deles, um folk progressivo, porém agitado, que animou o público. Después, el cantante comenzó a hablar en español con la platea. E seguiu tocando canções que constam no meu acervo de excelentes músicas: "Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band" e "With a Little Help From My Friends", dos Beatles, foram algumas delas. Eles também passaram pelo repertório de Bob Dylan, Raul Seixas, Neil Young, Velvet Underground e Raimundos – sempre com a companhia de elementos de outras bandas do circuito alternativo brasileiro. No fim, terminaram com "Semáforo", a segunda música própria que eles tocaram naquela noite.
3 de dezembro de 2007
A primeira noite no inferno - pt.1
Chega uma certa hora da noite em que você é obrigado a tomar uma decisão: voltar para casa e dormir ou ir para um outro lugar e continuar se embebedando. Era uma quinta-feira fria e insossa e, obviamente, escolhemos a segunda opção.
O destino em questão seria o Inferno, uma baladinha para a juventude descolada paulistana. Estava acompanhado por dois ex-colegas de labuta, e um deles precisava tirar umas fotos da tal juventude descolada paulistana por motivo de trabalho. O convite foi feito e aceito por nós de prontidão.
O programa era perfeito. Já passava da meia-noite e estávamos sendo enxotados do bar onde nos embebedávamos desde as 19h, em um beco escuro da Domingo de Moraes. Sinal disso é que as cadeiras estavam sendo postas de cabeça para baixo sobre as mesas -- uma simbologia universal dos donos de bares, que significa "caiam fora".
Ainda trançando as pernas, seguimos para o local. É bom ressaltar que, embora a Augusta não fosse tão longe, a viagem não poderia ser chamada de tranquila. O fotógrafo/piloto de fuga tivera um acidente de trânsito violento algumas semanas antes, que o deixou desfigurado e internado por um mês no hospital. Para piorar, a gente ouvia At The Drive-in no carro, música que certamente afeta os neurônios sadios de uma pessoa.
Então eis que, na entrada da 23 de Maio, sentado no banco de trás, quase perco minha costela esquerda em uma iminente colisão lateral digna de um filme de Hollywood. "Estava olhando para aquele lado (o direito)", tentou se justificar o condutor, enquanto acendia um cigarro e se lamentava pelo misterioso surgimento de um buraco em sua jaqueta.
Enfim chegamos à rua Augusta, o local onde as coisas realmente acontecem
Primeiramente, nós paramos em um conhecido bar da Augusta, o Violeta, para molharmos a garganta. É lá onde os mais radicais do país se encontram. Logo na porta, era possível notar um grupo de punks, com seus moicanos altos e piercings perfurando os locais mais inusitados do rosto. As mulheres da roda também adotaram o visual dos indígenas americanos e vestiam muito couro e meia-arrastão. Certamente, nossa aparência e nossas roupas casuais causaram algum asco nos presentes. Mas isso pouco importava.
Continua...
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